domingo, 13 de março de 2011

Toma lá que é democrático

Já outros chamaram a atenção para o discurso inflamado (ou inflamável) do presidente da República, que – veio ele depois desmentir – não foi nada disso, que interpretaram abusivamente as suas palavras, etc., etc. Creio que aqui ainda foi pior a emenda que o soneto.  
Se não era bem isso o que o presidente queria dizer, a verdade é que o modo como disse e o contexto em que disse propiciaram as interpretações…
Ao fim e ao cabo, para não variar, ficámos sem saber, ao certo, o que o presidente disse ou, melhor dizendo, o que queria dizer.
Eu sugiro, com a ironia que estas coisas merecem, que se apague a cerimónia de tomada de posse do presidente, como se ela tivesse sido feita a lápis, e se apresente tudo de novo, incluindo um discurso novo, que, desta vez, não suscetibilize interpretações. Isto tudo, claro, a bem do presidente, de nós todos e, preferentemente, a bem da nossa sanidade mental.  
Também já muito se falou do desplante do Governo em criar mais um pacote de austeridade, pela calada, ao romper do dia, sem dar cavaco a ninguém, nem ao Cavaco.
A Democracia, na versão do Governo PS atual, é assim mesmo, do tipo “Toma lá que é democrático!”, ou na versão “Come e cala!”
Começamos a estar todos, ou, pelo menos, muitos, à rasca. Uns já estão há muito tempo, eu diria, para não ser exagerado, desde que perdemos o D. Sebastião, em Alcácer Quibir, nesse tempo em que os campos deste país “eram verdes”…
Depois disso, já muita coisa aconteceu em Portugal, mas a condição de andarmos à rasca não, essa manteve-se. Mesmo quando os republicanos derrubaram a Monarquia, em 1910, e criaram a República, para que deixássemos de andar à rasca, nunca deixámos de andar à rasca. Na primeira república, andámos à rasca; no Estado Novo, andámos à rasca; na república, dita democrática, atual, pós revolução dos cravos, andamos à rasca. Provavelmente, nunca andámos tanto à rasca (a afirmação mereceria um estudo clarificador…), como agora. Mas andámos sempre à rasca. Andar à rasca faz parte da nossa idiossincrasia, está no nosso mais profundo ADN, ao que parece.
A minha geração, de indivíduo com mais de meio século de existência, foi uma geração à rasca, se assim lhe quisermos chamar… À rasca com a liberdade, à rasca com a cidadania, enfim, numa palavra, à rasca com a democracia. Um país que não tem democracia é um país rasca, e os seus cidadãos vivem à rasca e podem até prefigurar a dimensão de uma Geração Rasca, o que me parece ser bem o quadro atual do país.
 Mas o andar à rasca está a assumir (outra vez) uma consciência mais pró-ativa, o que eu acho muito bem. Com ou sem música dos Deolinda, interessa que a Geração Rasca rejeite o epíteto, e, verdadeiramente, parta para o inconformismo de deixar de ser uma geração a viver à rasca.
Não é fácil, não será uma tarefa fácil, mas, seguramente, valerá a pena. Vale sempre a pena lutarmos por causa justas…
Fernando Hilário

1 comentário:

  1. Parabéns!
    Li há pouco os textos deste blogue e acho-os uma delícia...

    PS: Haverá muita gente (ainda) à espera que D. Sebastião regresse, para salvar a Pátria, numa destas manhãs de "nevoeiro"...

    Z

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